O fenómeno dos logradouros como habitação ilegal tem vindo a ganhar dimensão em várias cidades portuguesas, especialmente em zonas urbanas como Lisboa e Porto. Face à escalada dos preços no mercado imobiliário e à escassez de imóveis disponíveis, muitos proprietários e intermediários optam por adaptar espaços exteriores ou anexos, como logradouros, arrecadações, garagens e lojas, para fins habitacionais, sem respeitar as normas legais e técnicas de segurança e salubridade.

Estes espaços, originalmente destinados a fins agrícolas, de lazer ou de apoio a habitações, acabam por ser transformados em unidades habitacionais improvisadas. A ausência de ventilação adequada, isolamento térmico, instalações sanitárias e sistemas de segurança expõe os ocupantes a riscos graves para a saúde e para a integridade física. Além disso, a precariedade estrutural destas construções, muitas vezes erigidas ou modificadas sem qualquer licenciamento, aumenta o perigo de colapsos, infiltrações e incêndios.

Os logradouros como habitação ilegal são ocupados, na sua maioria, por pessoas em situação de vulnerabilidade económica e social. Entre os principais grupos afetados estão os imigrantes, que chegam ao país em busca de melhores oportunidades, e os estudantes deslocados, que encontram sérias dificuldades para suportar as rendas elevadas praticadas no mercado formal. Para muitos, a alternativa acaba por ser aceitar contratos verbais ou acordos informais, sem qualquer proteção jurídica, em troca de um teto, ainda que sem condições dignas.

A sobrelotação é um problema recorrente. Pequenas áreas de poucos metros quadrados são divididas em vários compartimentos improvisados, chegando a albergar várias famílias ou grupos de indivíduos. Em casos extremos, o arrendamento é feito por cama ou colchão, o que transforma o espaço num alojamento precário e insalubre.

A fiscalização, apesar de anunciada como prioridade, apresenta falhas significativas. As autarquias e as autoridades competentes nem sempre dispõem de recursos humanos e técnicos suficientes para detetar e atuar sobre estas situações. Quando ocorrem ações de inspeção, o desfecho tende a penalizar os inquilinos, que acabam desalojados, enquanto os proprietários frequentemente escapam a sanções ou reincidem na prática. Esta ausência de consequências efetivas incentiva a continuidade e a expansão deste mercado paralelo.

O impacto social e económico desta realidade é profundo. Para além de agravar a crise habitacional, a proliferação de logradouros como habitação ilegal mina a confiança nas instituições, fomenta a economia paralela e representa perdas fiscais significativas para o Estado. Ao mesmo tempo, contribui para a perpetuação de situações de exclusão social e precariedade habitacional, dificultando a integração de comunidades migrantes e fragilizando a coesão social.

As soluções para este problema exigem um esforço coordenado entre Governo, autarquias, autoridades fiscais e associações de defesa dos direitos dos inquilinos. Medidas como a imposição de padrões mínimos de habitabilidade, a formalização obrigatória de contratos e o aumento da oferta de habitação acessível são essenciais. A criação de canais seguros para denúncias, aliados a sanções realmente dissuasoras, poderá contribuir para travar a proliferação destas práticas.

Investir em programas públicos de reabilitação urbana e promover o arrendamento acessível, através de incentivos fiscais e parcerias com o setor privado, são passos importantes para diminuir a procura por soluções ilegais. Paralelamente, campanhas de sensibilização podem alertar potenciais arrendatários para os riscos e consequências de aceitar viver em logradouros como habitação ilegal.

A transformação clandestina de logradouros e anexos em habitações é um reflexo direto da falta de resposta eficaz à crise de habitação em Portugal. Combater este fenómeno não é apenas uma questão legal, mas também um imperativo de justiça social, saúde pública e planeamento urbano. Uma intervenção firme, acompanhada de soluções habitacionais dignas e acessíveis, é indispensável para garantir que todos tenham direito a viver com segurança, conforto e dignidade.

Fonte: CASA SAPO
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